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Experiência de fé no Centro de Santiago

por Fernanda Miranda, 17 de outubro de 2012
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A nossa querida amiga Dona Farta fez um texto para o NSG sobre sua experiência que teve em Santiago, no Chile.

Por Dona Farta

Visitar o Chile era um sonho antigo, e quando finalmente pude realizá-lo, não tive como fugir do roteiro tradicional, afinal era preciso conhecer também a Capital e sua história tão rica para tentar compreender o meu fascínio pelo país comprido que fica do lado de lá da Cordilheira dos Andes.

Depois de 4 dias de turismo nas montanhas nevadas e nas cidades vizinhas, parti para uma caminhada solitária e sem destino certo pelo Centro de Santiago. O sábado tinha amanhecido surpreendentemente ensolarado, depois de uma semana de muita chuva, e eu tinha em mãos apenas um mapa turístico que me deram na recepção do Hostel.

Caminhei do Barrio BellaVista, atravessando o belíssimo Parque Florestal, até chegar à Plaza de La Constituición, onde está o Palácio La Moneda – sede do governo Chileno. Naquele dia haveria Troca da Guarda, e pra mim, que nunca tinha visto nada do tipo, foi uma experiência bastante interessante e divertida, com direito a “Aquarela do Brasil” tocada pela bandinha no final da cerimônia, numa simpática demonstração de agradecimento aos turistas brasileiros cada vez mais presentes por lá.

Terminada a Troca da Guarda, segui minha caminhada aleatória pelo Centro, atravessando as principais avenidas, admirando a beleza dos prédios antigos e observando o admirável comportamento do povo santiaguino – que além de muito gentil, consegue manter o Centro Antigo limpo e organizado, o que tornou o meu passeio naquele lindo sábado de sol ainda mais agradável.

Alguns minutos depois cheguei à famosa Plaza de Armas, lugar bastante movimentado e que tem um interessante contraste de prédios históricos com edifícios modernos.

É também na Plaza de Armas que fica a belíssima Catedral Metropolitana de Santiago, que estava com todas as portas fechadas, o que quase me inibiu de prosseguir com a visita (estou acostumada com a Catedral da Sé em SP, com suas portas sempre abertas). Não sou católica nem pratico religião alguma, mas tenho um profundo respeito por todas, então meu receio era, sei lá, ser desrespeitosa tentando abrir a porta e entrar, algo assim…

Dona Farta
Fiquei ali, parada no meio da Plaza de Armas por alguns minutos tirando algumas fotos, e só depois de ver um casal de velhinhos entrar na Catedral é que fui atrás.

Igrejas sempre me emocionam, tanto pela suntuosidade quanto pela carga de fé que contém. Eu sabia que sentiria um friozinho na barriga quando entrasse na Catedral Metropolitana de Santiago, mas o que meus olhos viram quando a porta se abriu fez meu coração disparar, e imediatamente fui tomada por um misto de espanto e curiosidade.

A Catedral estava LOTADA e todos rezavam em uma só voz, concentradíssimos em algo que a princípio pensei ser apenas uma Missa. Me posicionei de modo que pudesse enxergar lá do fundo toda a nave central, que é absurdamente linda, e no meio daquela multidão avistei a autoridade religiosa que conduzia a celebração. Não sei qual é o nome correto, se era Padre, Bispo ou Arcebispo, mas era um daqueles padres que usam uma batina bem bonita (acho que se chama casula) e um mitra. Mais ao fundo, atrás da autoridade religiosa, haviam vários garotos de túnica branca (coroinhas?), e à frente do sacerdote, de costas para a Igreja, haviam 8 rapazes também de túnica branca, sentados em cadeiras, dispostas 4 de cada lado.

Fiquei ali parada alguns minutos tentando entender o que estava acontecendo, parecia realmente ser algo mais importante do que uma Missa, mas eu não fazia ideia… Fui andando em direção à nave direita, onde tive uma nova surpresa: 6 telões estavam posicionados ao longo da nave lateral e transmitiam imagens da própria celebração; ao redor de cada telão, uma aglomeração de pessoas assistindo, todos guardando tanta reverência e prestando tanta atenção que eu não me contive e, mesmo correndo o risco de ser indelicada, me aproximei para perguntar o que estava acontecendo.

É a cerimônia de ordenamento de padres!”, me disse um jovem chileno num espanhol tão apressado que quase não entendi, e rapidamente voltou-se para o telão, muito atento.

Imediatamente, tudo fez sentido. A catedral lotada, o ar solene da celebração, os jovens sentados de costas para a Igreja, a reverência das pessoas… O Chile é um país muito católico, e me senti imensamente privilegiada (e por que não abençoada?) por estar visitando aquele lugar lindo justamente num dia tão importante!

Andei mais um pouco tentando me aproximar do Altar, mas realmente havia muita, muita gente, então voltei para o fundo e encontrei um cantinho onde pude assistir o espetáculo que se seguiu.

Depois de algumas orações e do que pareceu um sermão proferido pelo sacerdote, começou o Ordenamento dos Padres propriamente dito. Neste momento as pessoas que estavam até então quietas e atentas transformaram-se no que não posso chamar de outra coisa que não seja “torcida organizada”.

Conhecido pelo seu trato com as crianças e pela sua sensibilidade para lidar com os problemas das comunidades carentes, Padre Fulano de Tal!”, anunciava o sacerdote, e imediatamente faixas e cartazes eram erguidos no meio da igreja, juntamente com gritos de “viva!” e muitos aplausos. O fato se repetia a cada nome anunciado, uma coisa tão linda e tão intensa que não consigo nem descrever.

Observei pessoas chorando, emocionadíssimas, e outras tão felizes que não conseguiam tirar um sorriso largo do rosto e um brilho ofuscante do olhar. Era de fato um acontecimento muito especial para quem estava ali, algo muito importante para a Igreja, provavelmente para o país. Nunca na minha vida vi nada parecido.

Assisti o ordenamento até o final, e saí um pouco antes de a cerimônia terminar, perto do meio-dia. Me escorei aos pés de um monumento de frente para a Catedral e fiquei observando as pessoas que aos poucos deixavam o local ainda muito emocionadas, se abraçando e comemorando com uma felicidade tão genuína que encheu meu coração de fé e esperança.

Eu, que não sou católica nem religiosa, vivi uma experiência transcendental bem ali, no meio da multidão que circula freneticamente pelo Centro de Santiago, sendo agraciada por uma onda de boas energias e bons sentimentos vindos de pessoas que nunca vi na vida, e então ali, no meio da Plaza de Armas, sozinha, quietinha, e de longe, eu chorei.

Divino e Maravilhoso!

Fernanda Miranda

Recém-formada em jornalismo e editora do Não Só o Gato. Ama história em quadrinhos, os textos da jornalista Eliane Brum, as trilhas sonoras dos filmes do Woody Allen e azeitonas.

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