Museu Mazzaropi – pelo cinema nacional
Certa vez tive uma aula, de um certo tipo de marketing, onde o mestre marqueteiro que lá ministrava classificou o hábito de ir muito ao cinema como um “hobby de menino de condomínio”, bombardeando a sala de dados e mais dados que mostravam a distância entre os brasileiros e as telonas. Então comecei a digerir o provocante termo utilizado pelo professor falastrão e, engraçado que só agora, alguns anos depois de formado, que eu realmente o digeri. Só tive noção da verdadeira odisseia que nosso país percorreu para ter uma convivência um pouco mais intensa com a sétima arte quando conheci as antigas instalações da PAM filmes, iniciais de “Produções Amácio Mazzaropi”, onde hoje abriga o Museu Mazzaropi, em Taubaté, São Paulo.
Pobre “menino de condomínio” que fui! Urbanoide que já assistiu tanta besteira com sotaque de outro hemisfério e demorou vinte e tantos anos para entender que o nosso Carlitos é um Jeca. Que já viu tanta première em Leicester Square e nunca tinha se locomovido para alguns quilômetros ao lado de sua casa taubateana para prestigiar o berço de alguns dos recordes de bilheterias de seu país. Que não tinha a menor ideia da grandeza da obra do humorista, artista circense, ator, roteirista, diretor e produtor Mazzaropi.
Conheci o Museu Mazzaropi porque ele fica junto do Hotel Mazzaropi, local onde meu primo já trabalhou e quis me apresentar. Quando passamos pela portaria do hotel meu primo comentou, “tá vendo esse senhorzinho da portaria? Ele já participou de alguns filmes do próprio Mazzaropi.” O senhorzinho devia ter uns 80 anos, respirava história, e rapidamente percebi que não era só ele que tinha uma história interessantíssima naquele lugar. O museu fica em um galpão com grandes cartazes de seu homenageado na parte de fora e logo quando entrei fiquei maravilhado com as câmeras e projetores antigos que lá tinham. O museu também tinha uma moça – todo bom museu tem uma moça que sabe de tudo e cobra o ticket de entrada – e aí eu entendi que o Mazzaropi era um “geniozinho” e que suas atuações eram apenas a “ponta do iceberg”.
Ele foi um cara que lutou para brilhar, sem muitos incentivos, passou pelo circo, teatro, rádio e TV. Uma longa história antes de chegar ao cinema, mas chegou, em 1952. Seu primeiro filme, o Sai da Frente, fez sucesso e então ele seguiu fazendo mais filmes. Em determinado momento, bingo, entendeu que em vez de trabalhar para produtoras ele poderia fazer sua própria produtora e trabalhar para ele mesmo. Assim nasceu a PAM filmes, no lugar onde eu pisava. O Jeca mostrou seu talento como empresário, e mais que isso, produziu e distribuiu seus filmes para todo o Brasil, ia até em salas de cinema para fazer um “laboratório” de suas piadas com o público. Como todo gênio tinha suas manias, era anti-social e gostava de aparecer só no programa da “made in Taubaté” Hebe Camargo. Olha que gracinha o vídeo abaixo.
http://www.youtube.com/watch?feature=player_detailpage&v=iseuxyVfuj0
Inclusive esse vídeo eu vi lá dentro do museu, em uma “sessãozinha” no meio de inúmeros objetos utilizados nas gravações dos filmes – não acreditei quando vi a famosa espingarda de pegar “veado na curva”. O lugar é um verdadeiro templo do cinema nacional, onde um cara fez uma obra que quebrou recordes. Em entrevista para a revista Veja, ele disse: “Conte a minha verdadeira história, a história de um cara que sempre acreditou no cinema nacional e que, mais cedo do que todos pensavam, pôde construir a indústria do cinema no Brasil. A história de um ator bom ou mau que sempre manteve cheios os cinemas. Que nunca dependeu do INC – Instituto Nacional de Cinema – para fazer um filme. Que nunca recebeu uma crítica construtiva da crítica cinematográfica especializada – crítica que se diz intelectual. Crítica que aplaude um cinema cheio de símbolos, enrolado, complicado, pretensioso, mas sem público. A história de um cara que pensa em fazer cinema apenas para divertir o público, por acreditar que cinema é diversão, e seus filmes nunca pretenderam mais do que isso. Enfim, a história de um cara que nunca deixou a peteca cair”. Eu conto! E se eu pudesse dizer algo pro Mazzaropi eu diria que os problemas do seu Jaca Tatu, como preconceito, corrupção e compra de votos, de forma alguma são “só” para divertir. Que seus filmes são sim cheios de símbolos e possuem algumas das fotografias mais belas que já vi. Falaria que quanto aos críticos de cinema… Ah! Eles são só meninos crescidos de condomínio.
Fotos por Adolfo Martins
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