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Malucos, cavalos e pandas mais espertos que a média

Como o "Sax in the Beats" se tornou uma referência de banda de rua.

por Adolfo Caboclo, 11 de junho de 2015
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Não sei por que diabos por qual delírio insisto em procurar malucos.

“Pois os vendo loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que normalidade é uma ilusão imbecil e estéril”. Oscar Wilde escreveu isso em 1800 e bolinhas. O imagino escrevendo em sua terra natal, Dublin. Wilde casou-se com outro homem em uma Irlanda que viria aprovar o casamento gay apenas no mês passado, quase 200 anos depois.

Entendo a falta de saco do escritor para o “normal”, para as “pessoas de bem”. Wilde era brilhante e não era compreendido pelas pessoas que o cercavam. Pessoas que não possuíam nem uma fagulha de seu brilhantismo com as palavras. A verdade é que os “loucos” podem fazer coisas realmente muito mais bem feitas que os “normais”.

E olha que nos últimos dias, o que eu conheci de maluco não é brincadeira! Como, por exemplo, o Cavalo Beats.

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O Cavalo Beats (da foto acima) que, junto com o Panda Sax, formam o Sax in the Beats. Dois malucos que mandam uma “sonzera” pelas ruas de cidades fantasiados, justamente, de Cavalo e Panda.

Malucos que, diga-se de passagem, fizeram o que a maioria dos artistas de rua “normais” não tiveram a capacidade de fazer. Por exemplo, entendem que o “produto” que eles “vendem” nas ruas é totalmente diferente do que o que eles “vendem” nas redes sociais. Só de entrar no Facebook da dupla já é possível perceber que eles tiveram o cuidado de chamar um fotógrafo para gerar imagens de divulgação e criar vídeos. Pequenas narrativas que funcionam muito bem para a internet. Além do apelo natural de suas fantasias. O resultado foi que o Sax in the Beats hoje toca em festivais, por ruas de todo o Brasil e é a banda da primeira temporada do talkshow de Antonio Tabet no canal TBS, o Show do Kibe.

Abaixo, segue um papo que tive em um almoço com o Cavalo, quer dizer… com o John Paiva, onde tentei entender melhor esse movimento das ruas para as telas.

Não Só o Gato: A primeira coisa que me chamou muito a atenção no trabalho de vocês é o cuidado e profissionalismo que vocês tiveram com a identidade do Sax in the Beats. Conheci o panda, o cavalo e suas fotos e vídeos antes mesmo de conhecer o som de vocês. O que veio primeiro, essa estética tão forte ou a vontade de ter uma banda?

Sax in the Beats: Com a música. Nós dois somos músicos. Nos conhecemos aqui em São Paulo, mesmo ambos sendo mineiros. O Nilton (Nilton Cezar, o Panda) estava precisando de um lugar pra morar e então apareceu uma vaga na minha república. Conversarmos muito sobre música e veio a ideia de tocarmos na rua. Juntamos e fomos ver no que que dava, a gente queria experimentar a rua. Queríamos saber se era legal, como o público iria receber a gente, se era legal ou não. A gente queria tocar!

Fomos sem máscara, sem nada. No princípio eu até tocava violão em vez de bateria. Começamos violão e sax, foi legal, mas o som do violão quase que nãao saia perto do sax. Então se era pra fazer barulho, eu trouxe a minha bateria, que estava em Minas e começamos sax e bateria com o mesmo repertório. Jazz, funk e pop. Puchamos tudo mais pro funk. E aí, mais ou menos depois de um ano tocando sem as máscaras, eu, como também sou publicitário, me senti obrigado a criar um diferencial. Foi aí que eu fiquei pensando pra ver o que nos faria ser lembrados.

Depois de bastante tempo pensando chegamos ao panda. Então começamos a pesquisar máscaras. A ideia era usar uma fantasia completa, o que não aconteceu. Também tinhamos pensado em fazer dois pandas, mas antes compramos só uma máscara, pra testar a adaptação da boca para o sax e depois não encontramos outra máscara de panda pra vender.

Depois de mais algum tempo pensando, encontramos o cavalo. Que deu certo. O cavalo e o panda se deram bem. O panda fofinho com um instrumento mais melódico e o cavalo na percursão.

NSG: Isso foi durante quanto tempo?

SB: Ficamos mais ou menos meio ano no sax e violão, Sax in the Beats veio logo depois, mesmo sem os animais. Depois de um ano criamos os bichos, o cavalo e o panda, quando colocamos as máscaras juntos pela primeira vez, já foi o sinal pra criarmos o figurino, de terno. Estamos sempre de terno. Na praia, meio-dia, usamos terno, rs.

Foi colocar os bichos que surgiram vários convites pra eventos, começamos a aparecer em blogs.

NSG: E o programa do Kibe Loko?

SB: Surgiu quando conhecemos a Lilian, que foi uma das diretoras da MTV. Ela chamou a gente pra fazer um vídeo, um teaser. A gente foi lá e fez e então ela disse que queria fazer mais coisas com a gente. Passou seis, oito meses e então ela entrou em contato com a proposta do Show do Kibe. A ideia de sermos a banda, em um programa que quer ser a desconstrução do talkshow.

A gente sempre tentou fazer um negócio profissional, porque as pessoas tem uma ideia errada de artistas de rua. Tem muito artista de rua formado em faculdade. Por isso sempre tivemos o foco de sermos profissionais com logo, fotos, página no Face…

NSG: Sempre gostamos da ideia de ocupar a cidade, o que não é uma mentalidade típica do paulistano, então vieram dois mineirinhos que chegaram ocupando as ruas de uma forma tão marcante. Conta um pouco dessa relação do Sax in the Beats com o espaço urbano.

SB: A gente tinha a ideia de quabrar a rotina das pessoas. Então na república que moramos, dividimos o teto com um arquiteto, um cara que estudou isso, e então começamos a discutir isso e perceber o quanto esse trabalho é importante para a cidade. A ocupação da cidade, quando vamos lá e usamos a rua, é muito mais impactante do que quando alguém faz um show privado. Você tá modificando a cidade, as pessoas. Você tá tirando o som de carros pra colocar o som de música.

Essa ocupação é importante pra contrução da sociedade. De novas ideias, educação e tudo mais.

A gente já recebeu um monte de depoimentos, e-mails e mensagens de Facebook de pessoas dizendo que estavam tristes, nos viam e o dia delas mudou. Teve um cara que disse que tava sem perspectiva de vida nenhuma e nos viu “correndo atrás” e hoje está bem melhor de vida.

NSG: Por falar em cidade, vocês viajaram bastante esse ano, né?!

SB: Pra tocar na rua mesmo nós só fomos pro Rio, queríamos sair um pouco de São Paulo. Temos viajado bastante pra eventos, pelo estado de São Paulo em casamentos, formaturas, no SESC, em vários lugares. Fizemos viagens pro nordeste – Fortaleza, Recife, Salvado e Aracajú . As pessoas são muito receptivas, param pra interagir. São legais com a gente.

NSG: No Face de vocês tem muitos vídeos com histórinhas…

SB: Temos a ideia de que são duas coisas diferente: a rua e a internet. Tem conteúdos de shows que não são tão legais assim pela internet. O vídeo do metrô bombou, saiu em vários sites e blogs. Entendemos que o conteúdo da internet tem que ser diferente. Tentamos sempre criar histórias em nossas viagens, vídeos com historinhas diferentes e tudo mais.

A ideia é ir agora pra lugares além desses que eu falei. Queremos ir, por exemplo, pra teatros. Fazer uma coisa com os bichos, musicalmente legal, com interação. Ir um pouco pro ambiente indor, mas nunca deixar a rua.

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Adolfo Caboclo

Artista e pugilista. @adolfinhocaboclo

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