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As trisavós de Vieira Andrade

por Adolfo Caboclo, 1 de novembro de 2013
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Durante a nossa odisseia profissional de cada dia somos tomados por um complexo emaranhado de experiências e sentimentos absolutamente particulares que nos regem. A bem da verdade é que buscamos, não só no trabalho, mas também na vida, pessoas para admirarmos. Seres que acreditam na evolução.  Como exemplo disso, quero contar por aqui um breve resumo da história – e do amadurecer – de um ex-colega de trabalho, o Renan.

Este sempre foi um promissor e querido profissional da comunicação da “firma” que trabalhei em outros tempos e, aos poucos, começaram a eclodir por aí não apenas suas obras profissionais e digitais, mas também algumas obras artísticas e manuais que iam sendo divulgadas em sua timeline do Facebook.

Não sei exatamente quando o Renan passou a assinar como o artista Vieira Andrade, mas foi quando eu vi seu trabalho atual – uma escultura de uma velha desnuda – que a “tal admiração”, que comentei, explodiu e pensei: esse cara é foda!

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Na verdade essa imagem é a trisavó de Vieira (tataravó em português brasileiro, mas Vieira Andrade se tornou um artista com ênfase em suas raízes lusitanas), e, como ele mesmo diz, “a questão de histórico familiar, de herança cultural, do repertório que você já recebe dos seus pais, pra mim isso já é material de trabalho”. Realmente, durante todo o papo que tivemos, foi bem legal ver a valorização de referências que ele tanto absorve.

Com 12 anos Vieira ficou sabendo de um ateliê que tinha no Largo São Francisco, do lado da faculdade de direito, onde tinha um frade que também era artista plástico, seu amigo, até hoje, Frei Pedro.

IMG_1182“Era um ateliê com prensa de gravura, com forno de cerâmica, frequentado por um pessoal das artes”, comentou o artista lembrando onde aprendeu durante alguns anos a sua base em desenho. Posteriormente ele se formou na faculdade de artes plásticas e, no ano passado, viu um edital para inscrições de residência artística na Vila Nova de Cerveira, em Portugal. Assim se desenvolvia sua sina.

Começou com o “Relicários meus, relicários vossos” que são bustos de típicas senhoras portuguesas e dentro deles, no peito, pequenas relíquias do norte português. A maior referência do artista sempre foi a sua tataravó Delfina, mãe de seu bisavô. Foi emocionante quando Vieira começou a contar o que viveu em Portugal buscando a história de sua família e principalmente, de sua trisavó Delfina que virou sua maior personagem. “Aproveitei para ir pra aldeia de onde veio o meu bisavô. Descobri que o passado não era tão bonito assim, a Delfina bebia, estava largada e velha. Isso numa aldeia no meio da serra”, comentou Andrade.

Seu segundo trabalho nessa linha lusitana, o “Delfina Infinita”, também foi baseado na foto da tataravó que ele contemplava desde pequeno, junto com suas referências ibéricas e familiares.

_DSC0281Isso pouco antes de sua parceria com o fotógrafo Gustavo Carvalho. Vieira construiu uma Delfina articulada e foi com o fotógrafo até Portugal criar composições. “As Delfinas, narrativas de inquérito”, conta com objetos como tecidos de 200 anos de idade e até mesmo fotos em uma antiga adega localizada na casa da prima de quarto grau que conheceu em sua primeira passagem em terras lusitanas.

05_delfinaSobre o primeiro ensaio que comentei por aqui, Vieira Andrade me contou que está fazendo as esculturas de oito trisavós nuas. O artista também possui raízes italianas e indígenas, então esse é um trabalho de muita pesquisa e um resgate cultural primoroso. Aliás, primoroso é toda a obra de Vieira, pois eu comentei por aqui apenas as que remetem a Delfina, no site dele podemos ver muito mais. Veja aqui um vídeo em que uma antiga conhecida de Delfina a descreve, o “Dossier Delfina”, que é muito interessante de assistir, para entrarmos na atmosfera da obra do artista enquanto esperamos que nos próximos meses venham mais sete tataravós como vieram ao mundo. Como Vieira vê o seu mundo.

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CERVEIRA_01Fotos de Gustavo Carvalho e Ricardo Matos

Adolfo Caboclo

Artista e pugilista. @adolfinhocaboclo

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