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Palavras ao vento, o sopro, sua voz em movimento

Se por desleixo o riacho cessa, a menina do olho seca.

por Flavio Lobo, 13 de agosto de 2020
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Ouve o que ela fala? O final ficou claro? A menina molha os pés no riacho, se por desleixo ele cessa, a menina do olho seca. Escuta o que ela diz? Se por descuido der de ombros para o que ela sopra, saiba, já se fala por onde a história passa (entre margens) o percurso do riacho que vai abaixo. Não há como se esconder, omitir de quem ama a dor dos fatos, o final do que ela acha que é o riacho, a mina, o olho da menina, ouve o que ela vê e lhe diz? Agora é a hora, bota para fora. Estás são?

Sobre o teor da história, a lembrança que carrega, vagarosa, incessante trajetória, a sucessão dos fatos. As águas que se renovam corrente, os pés da menina, suas raízes, as árvores que dela ramificam o mundo, seus frutos. Os pés descalços em contato com o riacho, cristalino retrato, a imagem sobre o leito feito um manto, de passagem, o fluxo ininterrupto ouve o som? Por certo, não haveria tanto deserto. O íntimo sobressaído do corpo do riacho exposto, feito caminho de veias abertas, na época das nossas secas.

A menina do olho espelha a face do riacho. Através do reflexo ela se deixa levar pela corrente, passa a seguir o fluxo, como se o olho fosse o riacho e ela pudesse ir com ele abaixo, os pés depois o corpo, e para além do corpo animado movimento. O sentimento de pertencimento e fluidez, de uma vez, não há como ir contracorrente, por mais que ela tente. As águas circulam no corpo da terra que pulsa. E se por desleixo ele cessa? A menina do olho seca, mas seu íntimo o desbravaria por inteiro, se recolher não torna ninguém menor. Ouve o que ela diz? Palavras ao vento, o sopro, sua voz em movimento. Estás em si? Se sente muito e muito só?

 

Banhistas (Maria Auxiliadora, 1973, óleo sobre tela)

Banhistas (Maria Auxiliadora, 1973, óleo sobre tela)

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