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De que maneira você expressa o cinema?

por Heitor Botan, 10 de março de 2014
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Na última edição do Oscar, fui a um jantar em que cada convidado tinha que levar um prato inspirado em algum dos indicados a melhor filme. E era tudo muito bem organizado: além de haver um sorteio prévio para cada um saber de qual filme iria levar o prato, ainda existiria um prêmio para aquele ou aquela que preparasse a receita mais original (prêmio este carinhosamente apelidado pelos anfitriões de best achievement in the kitchen). No caso, fui pé-quente: levei um prato inspirado no ganhador de melhor filme, o 12 anos de Escravidão.

Meu prato! Meu prato!

Um filme pode ser retratado de muitas maneiras além da óbvia “crítica” que algum jornalista ou especialista vai publicar na mídia, ou que alguém vai publicar em sua página pessoal nas redes sociais. É a partir de fotografias pessoais que a cinéfila Nathalia Montecristo exprime seu interesse por cinema. Ela consegue identificar no seu cotidiano — na sua profissão (ela é relações públicas dos Canais Sony), nos locais que frequenta, nas roupas que veste ou na maquiagem que escolhe —  algum vínculo com algum diretor. E assim, fotografa e publica a imagem em suas redes sociais, como as vezes em que homenageou Wes Craven, Dave Boyle e Baz Luhrmann.

Wes CravenBaz Luhrmann

Wes Craven                                           Baz Luhrmann

Quando sai do âmbito pessoal, o interesse por cinema pode virar, inclusive, uma mostra de arte. Foi assim que surgiu a exposição 7 da 7ª arte, realizada no Bar Kabul no dia 6 de março. Silvana Viestel, a curadora da mostra,  selecionou sete artistas para escolherem entre sete diretores de cinema aquele que gostariam de retratar. A criação e a técnica eram livres, sem palpites da curadora.

A artista Barbara Heliodora escolheu David Lynch, diretor que buscou construir a linguagem do sonho — e do pesadelo — nos seus filmes, e por isso contribuiu muito ao oferecer um caminho perturbador e surreal ao cinema. Um dos elementos mais marcantes da obra de Lynch, a violência, foi o que determinou a escolha do diretor por Barbara. “Eu gosto de retratar a violência nas minhas obras”.

Obras inspiradas em Pedro Almodóvar Obras inspiradas em Pedro Almodóvar

Ao selecionar Lynch, Barbara procurou outras referências do diretor, além dos filmes que já tinha assistido. Assim, encontrou os curta metragens, dentre eles Six men getting sick, de 1966, e The Amputee, de 1974, ambos disponíveis no YouTube.

Além da violência, Barbara não deixou de imprimir outra característica marcante do diretor: a linguagem distorcida, menos realista, onde as consequências dos fatos não são explicadas diretamente. A artista nem poderia deixar de homenagear o primeiro filme de Lynch que assistiu: Cidade dos Sonhos, cuja tela leva o nome de Betty. Mesmo sem ter relação com o filme, é por esse carinhoso apelido que Barbara é chamada pelos amigos.

David Lynch também era o diretor que outro artista chamado para a exposição, Masayoshi Ninomiya, queria retratar. Foi aí que a curadora teve que intervir e deixou Masayoshi escolher outro diretor. Seguindo a mesma vertente da ação e da violência, o selecionado foi Guy Ritchie, que ganhou uma boa retratação de Snatch – Porcos e Diamantes.

Masayoshi teve a opção de escolher um diretor, e mesmo assim decidiu não retratar seu favorito: o chileno Alejandro Jodorowsky, de A Montanha Sagrada, El Topo e Fando Y Lis. Quando pedi para ele me falar um pouco da obra de Jodorowsky, que eu não conhecia, Masayoshi acaba me explicando porque não o retratou em sua criação para a mostra. “A obra dele já é difícil transcrever em palavras para você. Não imaginei que conseguiria transcrever em um desenho”.

É verdade. Muitas vezes é difícil explicar um filme para um amigo. Ou até explicar o porquê você gostou desse filme, pois as suas impressões de uma obra dependem muito da sua vivência, das suas experiências e da sua bagagem cultural. Cinema é uma arte para ser desfrutada individualmente. Por isso sempre há o recado de não conversar com as pessoas ao lado quando uma sessão vai começar. As reações que o cinema provoca são indescritíveis. Mas nada impede de você preparar uma receita, fazer um ensaio fotográfico ou montar uma exposição na tentativa de explicar aos amigos porque gosta tanto de cinema.

Inspiração em Tim Burton

Inspiração em Tim Burton Inspiração em Quentin Tarantino

Inspiração em Quentin Tarantino

Artista Barbara Heliodora, diante das telas que criou para retratar a obra de David Lynch Artista Barbara Heliodora, diante das telas que criou para retratar a obra de David Lynch

Heitor Botan

Heitor Botan é jornalista por formação, relações-públicas por vocação e publicitário por opção. É interessado por música, filmes, livros, ciência, artes, design e explorar lugares novos. Não começa o dia sem um pão na chapa e um suco de laranja e não começa nenhuma conversa com pessoas que olham como loucas e falam ‘você TEM QUE...’.

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