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Must be funny, in the rich man’s world

Um evento sobre o mercado do luxo aos olhos de um rapaz sem "crasse"

por Adolfo Caboclo, 27 de novembro de 2014
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É queridinhos, que comam brioches! Já diria um renomado carnavalesco maranhense, o povo gosta de luxo. Quem gosta de miséria é intelectual.” Outra musiquinha já sugere: “money, money, money, must be funny, in the rich man’s world”.

“Brincadeiras ostentação” à parte, como eu sempre falo por aqui, sou um apaixonado por narrativas. Amo filmes, livros, viagens, blogs e todos os tipos de histórias que a vida pode me apresentar. Como publicitário, aprendi a também ver uma marca – ou brand, em “coxês” – como uma narrativa. A imagem da Madonna, do político engomado, do castelo da Cinderela, a foice e o martelo cruzados sobre o vermelho e a maçã da Apple: todos são exemplos de marcas que possuem uma história, que simbolizam pessoas, ideais, que podem ser amadas ou odiadas, podem ocupar sua mente, te proporcionar uma identificação ou até podem ser irrelevantes aos seus olhos. O fato é que até o cheiro do café da sua avó é uma potencial narrativa.

Muito bem, partindo dessa premissa ajudei a articular a participação da empresa que trabalho para estar no evento Journée du Luxe, que consiste basicamente em palestras com nomes que são referências no mercado do luxo em uma pomposa sala, no pomposo shopping JK Iguatemi.

Por lá, no evento que ocorreu essa semana, escutei histórias nas quais entendi um pouco mais sobre como são construídas essas tais narrativas no momento em que elas são destinadas para pessoas endinheiradas.

A primeira palestra foi ministrada pelo Marco Scabia – vulgo ex-marido de Daniela Mercury. Ok, acho uma sacanagem colocar essa dado aqui, já que não tem nada a ver com o assunto… mas não resisti. Sorry – ele mostrou um conhecimento profundo sobre branding, confesso que fiquei bem impressionado ao descobrir que ele é um concierge. Nessa hora vi que não é apenas o Don Corleone que usa dos serviços de concierge, vi que tem gente disposta a pagar milhares e milhares de dólares para alguém conseguir ingressos para festas e shows exclusivos e viabilizar infinitas peculiaridades que apenas o dinheiro pode nos proporcionar. Marco falou, por exemplo, sobre uma cliente que queria fazer uma festa rosa e ele foi obrigado a trazer animais rosas para o Brasil. Imagina ter que importar alguns flamingos. Sim, FLAMINGOS, de verdade, vivos, para adornar uma festa!

Segundo ele e todos os outros palestrantes que falariam depois, o luxo consiste em dar ao cliente mais do que ele espera. Encantar. Outra coisa engraçadinha que vi nessa palestra foi algo que eu sempre soube: paulistas adoram falar que pagaram caro por algo, amam informar que saiu muito dinheiro de suas carteiras. Por outro lado, cariocas adoram falar que “conseguiram”, que entraram na festa porque são cools. Óbvio.

Após isso rolou uma longa palestra de Camila Klein, que, de fato, faz um trabalho muito bem feito com a sua marca. Existe um frescor reconhecido em suas lojas e produtos. Camila parece ter percebido que o charme de Paris não é a Champs-Élysées, mas sim as lojas de velhinhos nas travessinhas do Montmartre. O que eu achei mais legal dessa palestra foi a hora em que ela comentou que sua filhinha de oito anos, em seu aniversário, em vez de pedir uma festona de princesas em um buffet, pediu para fazer uma festa do pijama com as amigas em uma barraca. Essa nova geração que vem por aí é porreta, viu?

Depois foi a vez do Guilherme Padilha, um dos sócios do “super-Le jazz”, e que também cuida de uma empresa especialista em trazer gringos para hotéis de luxo no Brasil – Fasano e Copacabana Palace são exemplos dos hotéis em que ele trabalha. Ele falou um pouco sobre os valores que o turismo de luxo procura, como “exclusividade” e “descrição”, por exemplo, e comentou sobre o trabalho que sua empresa tem de mostrar que o Brasil não é só “natureza”. Uma coisa que achei interessante, que todos os outros palestrantes já tinham comentado, é o fato do mercado de luxo depender dos profissionais que se relacionam com o cliente. O cara que trabalha com isso tem que falar bem, tem que falar mais de uma língua, se o cara não atender bem perde o cliente, e por aí vai. E isso independente da marca. Não me venha com papo de colocar um totem ou um computador pra fazer um check-in no aeroporto ou vender algo: no mercado de luxo, o cliente vai sempre se relacionar com outra pessoa.

A primeira metade do evento me deixou bem empolgado, de verdade. Era uma grande oportunidade estar lá, aprendi muito. Depois do intervalo veio a quarta palestra e essa foi a hora em que o meu humor se alterou um pouco. Foi a palestra da principal empresa que recruta profissionais para trabalhar no varejo de luxo. Uma palestra com uma primeira metade óbvia – como dicas de formato de CVs e comportamento em dinâmicas – e uma segunda metade pra lá de preconceituosa. Nas entrelinhas, de forma sutil aos menos atentos, a palestrante falou da importância da tal “boa aparência”, detonou profissionais das gerações X e Z, pregou um modelo de gestão totalitário, legitimou o distanciamento do empregado com a própria família por motivos profissionais – tem que ver os filhos pequenos apenas quando eles estão dormindo mesmo – e como cereja do bolo fez uma piada falando que “o profissional tem que ter nível, não dá pra votar no PT, né” – frase que rendeu palmas da plateia e que quase me fez jogar um cinzeiro que estava do meu lado bem na testa dela. Não pela opção política, direito dela, mas pelo pré-julgamento leviano (como diria “Aécin”).

Representantes da cristais Baccarat foram falar depois. A marca tem 250 anos, então muitas coisas bacanas foram ditas, como o fato  de 80% da produção deles ir pro lixo devido ao grau de perfecicionismo – realmente, se você ver o vídeo de como os cristais são feitos, é impressionante – mas esse foi um momento em que o evento perdeu um pouquinho do foco e virou um “merchanzão”.

Depois  o especialista em vendas online Roberto Calderón falou sobre e-commerce de luxo, que é muito parecido com o e-commerce tradicional. A diferença é que o pico de compras no convencional costuma ser às quartas às 22h (o cara vê o futebol e a mulher vai comprar) e o horário de pico para o mercado de luxo geralmente é aos sábados às 3 da matina (o casal sai, toma uns vinhos, vê as coisas legais da “noite-chic” e vai para as compras). Pra quem gosta de business inteligence, a palestra foi um prato cheio.

O evento fechou com a Juliana Ferraz, que cuida da comunicação do Glamurama e de outros projetos da Joyce Pascowitch. Além de falar sobre a gestão do site, achei legal quando ela falou da tal “bolha da internet”. Hoje em dia qualquer grupo de jovens pode abrir um site (nóis!) e então o meio online dá uma inflacionada, por isso a parte impressa ainda tem seu importante valor. Traz credibilidade e tudo mais.

O legal mesmo desse evento foi ver que o luxo anda sendo trocado por termos como “trendy” e “cool”. Aquela estética “Luís XV” perde força e ações como andar de bicicleta e ir buscar o filho na escola se tornam um verdadeiro privilégio. É, se bobear as coisas não estão ficando cada vez mais down na high society (refrão mental na voz da Elis).

Marco Sacabia em sua palestra

Marco Sacabia em sua palestra

Adolfo Caboclo

Artista e pugilista. @adolfinhocaboclo

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