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Brumadinho

(último balanço: 259 mortos e 11 desaparecidos. contando...)

por Flavio Lobo, 17 de setembro de 2020
,

Vale?

A lama nos ama
a lama nos chama
a mancha deslancha…
Um mar marrom
arrebatou o rebento
da Terra que erra
era
sua terra
já agora unificada
nasceu às avessas
volta ao ventre
da Mãe
oh filho pródigo!

Partimos do cais,
chegamos ao caos.

Parimos o mundo do modo que dele viemos
Partimos do modo que o mundo vivemos.

Lutas, lutos
esculpidos do barro
traduzidos no mangue
derrama teu sangue
tinge tuas ruas cinzas
movediças
asfalto fala alto
asfalto cala ato
asfalto asfixia
(eu rio)
plano concreto
plena civilização.
Saímos da cama
fomos à lama!
Dela viemos?

Disseram não
à sorte,
à abundância,
quanta petulância!
Tem que ser
forte
tem que
lutar,
não relutar!
Mas, ouça
Senhor,
qual é a luta?
Lutas tramadas
em segredo
não tenha medo!
São desacordos
em prol dos fortes
dos fortes que eles veem
dos fortes que eles creem
dos fortes
de cima distante há léguas dos jardins
floridos onde as vítimas
homenageadas em vidas
exaustas estupefatas
de cores inebriadas
pelo frescor dos campos
das relvas da selva
de pedra o horizonte
tão belo
azul-verde-amarelo
tão próximo
do chão tão perto
da lama
a(cerca)do não.
Há fronteiras,
barreiras para todos
os lados que impedem
e se rompem como o peito!
Como o tempo
que tudo arrasta
num lamaçal devasta
devora assola
engole nos faz
iguais
para lembrarmos o cais
a origem
para celebrar a vida como ela é
não como deveria ser
vista assim do alto
do forte
tão perto do sol
que tudo derrete e transforma em lama
afinal, quem não a ama?
Seguimos!

 

Mundano

Mundano (acrílica, lama de Brumadinho e spray sobre réplica da obra de Pedro Américo, 2020)

 

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